Professor Vladmir Silveira

Author name: Professor Vladmir Oliveira da Silveira

A Decisão do STF na ADPF 153 (Lei de Anistia)
Artigos Acadêmicos, Direitos Humanos

A Cidadania Regional Americana e o Ordenamento Jurídico

A Cidadania Regional Americana e o Ordenamento Jurídico A tríade cidadania, direitos humanos fundamentais e dignidade humana representa o mínimo para que esse discurso passe a ser uma realidade concreta no mundo Revista Diálogos & Debates Por: Vladmir Oliveira da Silveira e Vanessa Toqueiro Ripari Dada a importância e a confluência entre globalização e cidadania hoje, principalmente coma ampliação da tutela dos direitos humanos fundamentais, resgataremos neste artigo o significado inicial, elucidando algumas mudanças que os conceitos de Estado e de cidadania vêm sofrendo conjuntamente a partir do alargamento e alcance atual dos direitos humanos. Analisaremos ainda a problemática da aceitação da soberania compartilhada por meio do Estado Constitucional Cooperativo para a efetiva compreensão e reflexão deste novo momento histórico, que por sua vez requer uma ação coordenada e solidária. Como reflexo do atual paradigma, emerge o conceito de cidadania pluritutelada, reconhecendo-se verdadeiramente a plena efetivação, a concretização e, acima de tudo, seu alcance universal, que Hannah Arendt resumiu como “o direito a ter direitos”. Sejam nacionais (fundamentais-estatais), regionais (comunitários-humanos) e universais (globais-humanos).   O ESTADO-NAÇÃO E A  CIDADANIA O período conhecido como Idade Média, em que predominou o sistema feudal, caracterizava-se politicamente pela fragmentação do podei de governo em diversos feudos e ficou marcado por lutas contra os abusos do poder instaurado. Marcelo Neves, no livro Trans constitucionalismo (São Paulo: WMF/Martins Fontes, 2009), explica essa relação hierárquica ao discorrer sobre a formação social pré-modema: “Como a sociedade se confundia com a própria organização política territorial, a distinção inclusão/exclusão identificava-se com a diferença membro/ não membro. O conceito de pessoa, associado à semântica moderna da individualidade, não estava presente, uma vez que não se distinguia claramente entre homem e sociedade-organização. Não havia limitações jurídico-positivas relevantes ao soberano no exercício do jus-imperium, ou seja. Limitações normativas estabelecidas e impostas por outros homens à sua ação coercitiva. Nesse contexto, pode-se falar de uma subordinação do direito ao poder. A subordinação do jurídico ao político, em uma  formação social na qual o poder está no centro da sociedade, leva a uma relação assimétrica entre o poder superior e o poder inferior ou entre o soberano e os súditos”. Com efeito, a ideia de cidadania era limitada, pois os senhores feudais exerciam o poder em seus territórios de forma quase ilimitada, numa relação de  suserania e vassalagem em que mesmo os servos obedientes não podiam participar dos destinos do feudo. Mas aos poucos a Europa presenciou o processo político de centralização e absolutização do poder na direção do Estado Moderno absolutista, autoritário e concentrado em regra,nas mãos de uma única pessoa- o  rei, que  titularizou o poder absoluto sobre o Estado. Em decorrência, o povo era desprovido de participação política, não cabendo falar, portanto, em cidadania no sentido moderno do termo. Iniciou-se assim uma nova época (a Idade Moderna) e os Estados se formaram em,  consequência da união de dois atores: o rei e a burguesia. O longo período entre o século XVI e o século  XVIII foi marcado por importantes movimentos filosóficos, sociais e jurídicos, permitindo o surgimento de um novo tipo de Estado: o Estado-Nação, inicialmente na versão-de Estado de Direito. O Estado de Direito irá se desenvolvendo, a partir dessa versão inicial, aliado ao processo dinamogênico, que fará com que ele passe à ser um Estado Social de Direito e, finalmente, um Estado Social democrático de Direito. O Estado Nação, convém observar, decorreu do conceito de Estado da Razão, fruto do Iluminismo. O intuito de individualizar cada grupo com uma cultura, língua própria, costumes também adveio dessa noção de Estado. Estabeleceu-se a ideia de que a pertença do indivíduo atal estrutura lhe confere segurança, aceitação e referência civilizacional. Sendo assim, pode-se dizer que o Estado-Nação se afirmar por meio de uma ideologia e por um aparato jurídico próprios, capazes de impor uma soberania sobre um povo num dado território, com moeda única e exército nacional. A principal característica do Estado de Direito é justamente a de que todos têm direitos iguais perante a Constituição. Percebe-se, assim, uma notável mudança no conceito de cidadania. Por um lado trata-se do mais avançado processo democrático que a humanidade já conheceu; por outro, tal processo implicou a exploração e dominação do capital, ao mesmo tempo que tornou a cidadania um conceito individualizado que alcança apenas o Estado Constitucional Nacional. Norberto Bobbio, ao discorrer no livro A Era dos Direitos sobre o significado filosófico-histórico de inversão, característico da formação do Estado moderno e que ocorreu na relação entre Estado e cidadãos, conclui que: “Passou-se da prioridade dos deveres dos súditos à prioridade dos direitos do cidadão, emergindo um modo diferente de encarar a relação política, não mais predominantemente pelo ângulo do soberano, e sim pelo do cidadão, em correspondência com a afirmação da teoria individualista da sociedade em contraposição à concepção organicista tradicional”. Pode-se dizer que ocorreu a ampliação dos direitos na passagem do homem abstrato ao homem concreto, por meio de um processo de reconhecimento de direitos e de proteção ao indivíduo, agora cidadão. A cidadania “fechada”, de origem grega, evoluiu para uma cidadania aberta ou compartilhada, não apenas para novos indivíduos, mas também para novos direitos. Exatamente por isso, ao analisar a condição dos apátridas nos regimes totalitários que antecederam a Segunda Guerra Mundial, Hannah Arendt afirmava (no livro Origens do Totalitarismo) que a real cidadania que devemos buscar deve ser fundada na proteção universal, sem determinar raça, cor ou sexo: “A calamidade dos que não têm direitos não decorre do fato de terem sido privados da vida, da liberdade ou da procura da felicidade, nem da igualdade perante a lei ou da liberdade de opinião (…) mas do fato de já não pertencerem a qualquer comunidade. Sua situação angustiante não resulta do fato de não serem iguais perante a lei, mas de não existirem mais leis para eles”. Ao analisar o papel do Estado na atualidade, emerge a necessidade da construção de uma via que afirme a globalização sem relegar o ser humano ao papel de mero ingrediente do regime econômico e dependente da tutela exclusiva do Estado. As atuais relações internacionais não mais permitem estruturas estanques de Estados fechados, desconectadas dos valores compartilhados pela comunidade internacional, como ocorria na época do Estado Constitucional Nacional. O paradigma dos direitos de solidariedade demanda um Estado “aberto” à cidadania. Assim, essa nova cidadania pela qual se clama também não pode ser alcançada nos moldes do tradicional Estado nacional homogeneizante, dominador (imperialista) e negador das diferenças, mas deve caracterizar-se por um conteúdo mais abrangente e sempre com pluralidade jurídica e de tutela. Torna-se imperioso por isso o reconhecimento de uma cidadania pluritutelada e, portanto, nacional, regional e universal, que assegure em diferentes partes do globo o “direito a ter direitos”, na célebre expressão de Hannah Arendt,

Os contratos na perspectiva humanista do Direito: o nascimento de uma nova teoria geral dos contratos
Artigos Acadêmicos, Direitos Humanos

Os contratos na perspectiva humanista do Direito: o nascimento de uma nova teoria geral dos contratos

Os contratos na perspectiva humanista do Direito: o nascimento de uma nova teoria geral dos contratos Clique aqui para acessar   Centro Universitário de Maringá Programa de Pós Graduação em Direito. Revista Jurídica Cesumar – Mestrado Autor: Vladmir Silveira   Introdução O presente trabalho procura trazer um estudo, assim como propor uma reflexão, acerca da influência dos direitos humanos nas relações contratuais, partindo da perspectiva clássica da força obrigatória dos contratos, designadamente pelo princípio do pacta sunt servanda, evoluindo para o reconhecimento da necessidade da presença da boa-fé na exteriorização da vontade que motiva a relação contratual, passando pela Revolução Industrial e conseqüente fortalecimento o capitalismo liberal e do individualismo, até se alcançar a perspectiva social e solidária dos contratos e o reconhecimento de novo modelo de contrato, firmado principalmente pela necessidade humana de consumo, o que levou à massificação das relações contratuais, assim como ao dirigismo Estatal para tutela dos interesses da parte mais fraca da relação. Nessa perspectiva procuramos desenvolver tanto o conceito de contrato tradicional e suas conseqüências jurídicas, especialmente no que tange aos vícios da vontade; assim como buscamos apresentar a idéia de contrato contemporâneo e o novo conceito de contrato pela ótica do solidarismo Constitucional. Pretendemos levantar o debate de temas atuais relacionados aos contratos, mas sem a pretensão de esgotá-los, como a crise dos contratos; o princípio da autonomia da vontade e seu confronto com o princípio da autonomia privada; e o diálogo das fontes. Por fim, será abordada a chamada nova teoria geral dos contratos no que tange à releitura do princípio da boa-fé, hoje definido como boa-fé objetiva; assim como o princípio da função social e solidária dos contratos como limite da liberdade contratual. 2. Formação histórica e pressupostos ideológicos dos contratos A reconhecida interdisciplinaridade dos estudos jurídicos com outras ciências humanas, especialmente a Social, a Política e a Economia, assim como a evolução histórica dos direitos humanos, a partir do que se concebeu uma nova perspectiva à dignidade da pessoa humana pelo processo da dinamogenesis[1][2], conferiu ao contrato uma nova roupagem, pela superação da idéia de que a igualdade formal dos indivíduos asseguraria o equilíbrio entre os contratantes, fosse qual fosse sua condição social. Nessa perspectiva, destacamos primeiramente o conceito de contrato conforme ensinamento da Escola de Pandectas, que adota o modelo codificado, pela qual contrato é uma categoria geral e abstrata que, segundo as regras da lógicaformal, pode ser reduzido à unidade no sistema conceitual. Tal sistema assemelha-se a uma pirâmide, que no topo contém um conceito geral ao qual se reduzem os demais conceitos abaixo subseqüentes, como subtipos daquele conceito generalístico.[3] Segundo Puchta[4], é tarefa do jurista a conexão lógica dos conceitos, que formará a consciência sistemática pela percepção do sentido ascendente dos conceitos identificados por intermédio dos termos médios que integram sua formação. Na escala da genealogia dos conceitos, o conceito de contrato sobe ao negócio jurídico, e daí para o fato jurídico, formando uma pirâmide. Nessa perspectiva, contrato seria negócio jurídico bilateral ou plurilateral[5] que por conter todas as características do negócio jurídico formaria um conceito derivado, possuindo todas as características gerais do negócio jurídico e outros elementos especializantes. Em que pese a contribuição da concepção de contrato acima exposta, outras correntes de pensamento também influenciaram na criação de seu conceito atual, dentre as quais se destacam: (i) a corrente de pensamento dos canonistas e (ii) a Escola do Direito Natural. A corrente de pensamento canonista ficou marcada pela substancial relevância atribuída ao consenso e à fé jurada na formação do contrato e obrigações dele decorrentes. Importa destacar que a corrente canonista significou um marco, pois foi a partir daí que se abriu caminho para os princípios da autonomia da vontade e do consensualismo[6]. Sob tal ótica, para a criação da obrigação, necessária e suficiente seria a declaração da vontade, desde que aliada ao dever de veracidade, valorizando-se com isso a palavra dada e reconhecendo-se sua respectiva aptidão para criar o vínculo obrigacional, assim como a necessidade de seu cumprimento. Nesse contexto, independente da forma do pacto, caberia ao direito assegurar a força obrigatória dos contratos como mecanismo jurídico de tutela dos valores envolvidos na relação contratual sempre que verificada a vontade livre e a fé jurada. Por outro lado, para a Escola do Direito Natural – racionalista e individualista –, o fundamento do nascimento das obrigações se encontra na vontade livre dos contratantes. Portanto, da mesma forma que a corrente de pensamento dos canonistas, a Escola do Direito Natural valorizava o consenso e o dever de veracidade, que é de direito natural. O diferencial está na forte carga individualista desta linha de pensamento, fruto da ideologia dominante na época de sua cristalização, revelada pela influência do regime capitalista de produção nos planos econômico, político e social, marcando o jusnaturalismo pelo individualismo, ou seja, pela superestimação do papel do indivíduo. Nesse sentido, com a acentuação do capitalismo, que tem sua base filosófica em Locke, maior importância se deu ao individualismo como reflexo da Revolução Industrial, acarretando a concentração de riquezas nas mãos do poder econômico privado, sendo, a partir daí, o direito de propriedade considerado um direito natural, protegido contra as forças do Estado como forma de garantir o abuso do poder político. De fato, o capitalismo funda-se nas liberdades individuais – liberdades negativas de primeira dimensão – em especial a propriedade privada. Por outro lado, reconhecendo-se no capitalismo um direito humano, qual seja o direito de propriedade, abre-se margem à interpretação do capitalismo na perspectiva humanista dos direitos, em todas as suas dimensões. É nesse sentido que se fala atualmente em capitalismo humanista, conforme defende o Professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Ricardo Hasson Sayeg, afirmando que “o espírito capitalista e o espírito de fraternidade são convergentes na medida em que não existe capitalismo sem que se reconheçam os direitos humanos. E conclui dizendo que “o que é certo é que os direitos humanos com todas as suas dimensões configuram um feixe indissociável, não cabendo se reconhecer uns e excluir outros.[7] Dentro desta perspectiva, ensina Willis Santiago Guerra Filho: […] Mais importante, é que os direitos gestados em uma geração,

Direito Penal Mínimo e Direitos Humanos na Política Criminal de Eugenio Raul Zaffaroni
Artigos Acadêmicos, Direitos Humanos

Direito Penal Mínimo e Direitos Humanos na Política Criminal de Eugenio Raul Zaffaroni

Vladmir Oliveira da Silveira Samyra Naspolini Sanches Resumo O presente artigo tem como tema a proposta de política criminal denominada Direito Penal Mínimo na obra do penalista e criminólogo argentino Eugenio Raul Zaffaroni, a qual se baseia nos Direitos Humanos como fio condutor. O autor parte da ideia de que o sistema penal, em especial os sistemas penais latinoamericanos, encontram-se deslegitimados e estruturalmente impossibilitados de cumprir as funções úteis que legitimam sua existência. Sua posição minimalista postula, a longo prazo, a abolição do sistema penal, mas admite que essa abolição deva passar necessariamente, a curto e médio prazos, de um lado, por uma profunda transformação do sistema penal, através de processos de descriminalização e de redução da pena e, de outro lado, pela reformulação do Direito Penal, utilizando-o como um instrumento contra a violência do próprio sistema penal. Para tanto, o autor recupera algumas garantias liberais do Direito Penal e utiliza-se dos Direitos Humanos, principalmente os enunciados na Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969, como base fundamental de suas propostas, para adequar a atuação do sistema penal para que esta, além de não os violar, encontre neles seu limite. O objetivo do artigo é o estudo aprofundado da política criminal do autor, buscando responder o que vem a ser e quais os fundamentos do “minimalismo penal” de Eugenio Raul Zaffaroni, e demonstrar que ele apresenta-se como uma tendência político-criminal apta a responder à deslegitimação do sistema penal. Por tratar-se de estudo descritivo, a presente pesquisa foi desenvolvida, utilizando-se do método indutivo e da técnica de pesquisa bibliográfica. Sua teoria de base é a Criminologia Crítica, uma vez que é a teoria criminológia a que se filia Zaffaroni. Conclui-se que o Minimalismo Penal revela-se como um empreendimento radical de transformação do sistema penal e da sociedade, propiciando   a possibilidade de identificar formas mais democráticas e criativas para a real solução dos conflitos, e não somente para a sua repressão. Palavras-chave:   Minimalismo Penal; Direitos Humanos; Eugenio Raul Zaffaroni; Sistema Penal. Abstract This actual article focuses on the proposed Criminal Policy called Minimum Criminal Law written by the Argentinian criminalist and criminologist Eugenio Raul Zaffaroni, which is based on the Human Rights as the common thread. The author expresses that the criminal justice system, especially the Latin American penal systems, are delegitimized and structurally unable to fulfill the useful functions that legitimize their existence. His minimalist position proposes, in a long term plan, the abolition of the penal system, but he admits that this abolition must pass necessarily, in a short and medium term, on one hand through a profound transformation with the decriminalization and the reducing of sentence, and on the other hand, the reformulation of the Criminal Law, to be used as a tool against violence with the law itself. However, the author recovers some liberal assurances from the Criminal Law and uses the Human Rights, especially those contained in the American Convention on Human Rights of 1969, as the foundation of his proposals to adjust the performance of the criminal justice system, not violating them, and also finding its limits.. The aim of the article is the deep study of the author’s criminal policy, seeking to answer what comes to be and which are the fundamentals of “criminal minimalism” for Eugenio Raul Zaffaroni and demonstrate that it shows itself as a political criminal trend able to respond to the illegitimacy of the penal system. As this a descriptive study, the actual research was developed using the inductive method and bibliographic research, its basic theory is the critical criminology that is the Zaffaroni’s theory. Concluding, the Criminal Minimalism reveals itself as a radical Criminal System and Society change, providing the possibility to look for more democratic and creative ways as solution for these conflicts and not only for the repression. Keywords: Criminal Minimalism; Human Rights; Eugenio Raul Zaffaroni; Criminal System.   Sumário Introdução. 1 O Realismo Marginal Criminológico. 2 O Minimalismo Penal. 3 Princípios de Direito Penal Mínimo. 3.1 Princípios para a Limitação da Violência por Carência de Elementaríssimos Requisitos Formais. 3.1.1 Princípio de reserva legal ou de exigência máxima de legalidade em sentido estrito. 3.1.2 Princípio de máxima taxatividade. 3.1.3 Princípio da irretroatividade. 3.1.4 Princípio da máxima subordinação à lei penal substantiva. 3.2 Princípios para a Limitação da Violência por Exclusão de Pressupostos de Disfuncionalidade Grosseira para os Direitos Humanos. 3.2.1 Princípio da limitação máxima da resposta contingente. 3.2.2 Princípio de lesividade. 3.2.3 Princípio da mínima proporcionalidade. 3.2.4 Princípio do respeito mínimo à humanidade. 3.2.5 Princípio de idoneidade relativa. 3.2.6 Princípio limitador da lesividade à vítima. 3.2.7 Princípio de transcendência mínima da intervenção punitiva. 3.3 Princípios para a Limitação da Violência por Exclusão de Qualquer Pretensão de Imputação Pessoal em Razão da sua Notória Irracionalidade. Conclusão. Referências. Introdução O presente artigo tem como tema a proposta de política criminal denominada Direito Penal Mínimo na obra do penalista e criminólogo argentino Eugenio Raul Zaffaroni, que tem nos Direitos Humanos seu fio condutor. O autor parte da ideia de que o sistema penal, em especial os sistemas penais latinoamericanos, encontram-se deslegitimados e estruturalmente impossibilitados de cumprir as funções úteis que legitimam sua existência. Sua posição minimalista postula, a longo prazo, a abolição do sistema penal, mas admite que essa abolição deva passar necessariamente, a curto e médio prazos, de um lado, por uma profunda transformação do sistema penal, através de processos de descriminalização e de redução da pena e, de outro lado, pela reformulação do Direito Penal, utilizando-o como instrumento contra a violência do próprio sistema penal. Os Princípios de Direito Penal Mínimo, enunciados por Zaffaroni, revelam-se, portanto, como estratégias de contração do sistema penal, visando conter a violência na qual se manifesta seu exercício de poder. Para tanto, o autor recupera algumas garantias liberais do Direito Penal e utiliza- se dos Direitos Humanos, principalmente dos enunciados na Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969, como base fundamental de suas propostas, para adequar a atuação do sistema penal para que esta, além de não violá-los, encontre neles seu limite. A justificativa para o artigo é o

O Princípio da Proporcionalidade e a preferência dos precatórios alimentícios
Artigos Acadêmicos, Direito do Servidor Público

O Princípio da Proporcionalidade e a preferência dos precatórios alimentícios

Autor: Vladmir Oliveira da Silveira Revista do Advogado –  Associação dos Advogados de São Paulo – AASP Ano XXXI – Nº 111 –  Abril de 2011. Sumário Introdução Breve histórico do regime de precatórios na CF 11988 e a problemática da preferência dos alimentícios. A preferência dos precatórios alimentícios e o Princípio da Proporcionalidade após a EC n° 62/2009 Conclusão Bibliografia   Introdução Quando se tem uma decisão judicial que tran­sitou em julgado contra a Fazenda Pública, a or­dem de pagamento e feita por meio de precatório. Desse modo, o Poder Público sofrerá uma execu­ção com obrigação de pagar, consoante os requisitos estabelecidos no art. 100 da Constituição Fe­deral de 1988 (CF/1988). A Fazenda Pública, por sua vez, estará obrigada a incluir no orçamento do ano seguinte valor suficiente para arcar com suas dívidas ­ ou seja, deverá incluir neste cálculo a totalidade dos requisitórios de precatórios daquele período. A problemática do precatório surgiu em torno da inadimplência do Poder Público. A ocorrência é antiga, mas alcançou patamares absurdos nos últimos anos anos, principalmente após a Emenda Constitucional   n° 30/2000, e é enfrentada por milhares de credores brasileiros, mormente no caso dos precatórios alimentares, de diversas esferas do Poder Público  e, por ironia, dos entes mais ricos da federação, como o governo do Estado de São Paulo. Constitui fato notório que muitos desses entes não vêm cumprindo suas obrigações, o que tem gerado acúmulo imenso de dívidas, tornando­-se cada vez mais difícil a regularização dos pagamentos. Atrelado a este efeito, verificamos o aumento rápido no número de intervenções legislativas desde a CF/1988, para instituir parcelamentos cada vez maiores. A problemática do precatório surgiu em torno da inadimplência do Poder Público. Em 1988, nossa CF, de maneira originária, previu o primeiro parcelamento dos débitos então existentes, no prazo de oito anos. Após 12 anos, a Emenda Constitucional nº 30/2000 estabeleceu novo parcelamento, de que foram excluídos os precatórios alimentares, mas, mesmo assim, foi necessário prazo ainda maior. Já em 2009, a Emenda Constitucional n° 62 ­ apenas nove anos após a Emenda anterior e sem se esgotar ainda o parcelamento anterior de dez anos ­ instituiu o prazo de 15 anos para parcelarnento de precatórios. Nessa esteira, não é exagero prever que em 2015 podemos ter nova intervenção legislati­va, provavelmente ampliando o prazo para pagamento destes precatórios em 20 ou 30 anos, se o paradigma de análise do problema não for alterado. Assim, nao resta dúvida de que o modo pelo qual temos enfrentado este sério problema deve ser revisto, principalmente no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF), que possui instrumentos reais para tanto. Embora se possa levantar uma série de questões específicas dentro do tema precatórios, nos valeremos de uma delimitação temática no contexto estabelecido nesta coletânea abordando especificamente a ordem de preferência dos precatórios alimentares dentro do sistema de pagamento de precatórios vigente originalmente na CF/1988 e após suas emendas. Para tanto, será tomada por base a doutrina de Robert Alexy sobre a aplicação do Princípio da Proporcionalidade.   2  Breve histórico do regime de precatórios na CF/1988 e a problemática da preferência dos alimentícios O sistema de precatórios, nos termos do art. 100 da CF/1988, repetiu o que era praticado ja antes de seu advento. Por ocasião de uma sentença contra a Fazenda Pública, o pagamento seria feito pela ordem cronológica de apresentação precatório e a conta dos respectivos créditos, As­sim, os precatórios requisitados ate 1 ° de julho seriam pagos até o final do exercício orçamentário seguinte, Nos termos originais da CF/1988, já era obrigatório para as entidades públicas incluir em seu orçamento verba suficiente para quitar suas dívidas de precatórios apresentados até aquela data (art. 100, S 1°). Nesse sentido, o grande garantidor do pagamento desses valores era o orçamento dos entes federados, que deveriam prever verbas para tal finalidade. De maneira simultânea ao sistema constitucional de precatórios promulgado em 1988, surgiu, no art. 33 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), a primeira prorrogação do pagamento para os pendentes em 1988 ­ que seriam pagos em oito prestações anuais, ressalvados os de caráter alimentar. Com a Emenda Constitucional n° 20, de 1998, foi acrescido o S 3° ao caputdoart. 100, instituindo­ se que o regime de expedição de precatórios não se aplicaria as obrigações definidas em lei como de “pequeno valor”. Em seguida, com o advento da Lei n° 10.259/2001 (Lei dos Juizados Especiais da Justiça Federal), ficou estabelecido que créditos de pequeno valor para a União seriam aqueles iguais ou inferiores a 60 salários mínimos. Com a Emenda Constitucional n° 37/2002 foi defini­do que, para efeito de dispensa da expedição do precatório, os débitos deveriarn atingir no máximo 30 salários mínimos  no caso dos municípios, podendo alcançar 40 salários mínimos no caso dos Estados. Nos termos do art. 100, S 4°, da Emenda Constitucional n° 62/2009, os valores, apesar de distintos para as entidades de Direito Público,  vem obedecer ao mínimo igual ao valor do maior benefício do regime geral da previdência social. Em 2000, a partir da Emenda Constitucional n° 30, foi incluído também o 1°­A, que definiu os débitos de caráter alimentício. 2 É relevante para nosso estudo notar que, com o advento da Emenda Constitucional n° 30/2000, surgiu outro parcelamento compulsório para os precatórios pendentes. Nos termos do art. 78 do ADCT: “Ressalvados os créditos definidos em lei como de pequeno valor, os de natureza alimentícia, os de que trata o art. 33 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e suas complementações e os que já tiverem os seus respectivos recursos liberados ou depositados em juízo, os precatórios pendentes na data de promulgação desta Emenda e os que decorram de ações iniciais ajuizadas até 31 de dezembro de 1999 serão liquidados pelo seu valor real, em moeda corrente, acrescido de juros legais, em prestações anuais, iguais e sucessivas, no prazo máximo de dez anos, permitida a cessão dos créditos”. Com o advento da Emenda Constitucional n° 30/2000, surgiu outro parcelamento compulsório para os precatórios pendentes. Os precatórios pendentes na data de promulgação da Emenda e os que decorriam de ações iniciais ajuizadas até 31 de dezembro de 1999, portanto, foram sendo pagos em prestacdes anuais no prazo

Direitos Humanos Fundamentais das Pessoas com Deficiência
Artigos Acadêmicos, Direitos Humanos

Direitos Humanos Fundamentais das Pessoas com Deficiência

Direitos Humanos Fundamentais das Pessoas com Deficiência Fundamental Human Rights of People with Disabilities   Clique aqui para acessar   Autor: Vladmir Oliveira da Silveira Pós-Doutor pela UFSC. Doutor e Mestre em Direito pela PUC/SP. Prisma Jurídico, São Paulo, v. 12, n. 2, p. 000-000, jul./dez. 2013.   Resumo: Este artigo versa sobre os direitos humanos fundamentais das pessoas com deficiência, sob a perspectiva do processo de dinamogenesis de direitos. Por se tratar de um estudo descritivo e exploratório, será realizado com base na pesquisa bibliográfica e histórica, utilizando-se por vezes do método dedutivo e, outras vezes, do indutivo, principalmente nas críticas e reflexões acerca dos textos normativos. A terminologia “direitos humanos fundamentais” se justifica na ideia de complementariedade entre as tutelas nacional, regional e universal desses direitos, constatado o fato de que há direitos humanos que são constitucionalizados e direitos humanos fundamentais que são internacionalizados, podendo-se afirmar a primazia dos direitos humanos fundamentais, tanto no âmbito nacional quanto no internacional. Nesse sentido, este artigo analisa a tutela jurídica das pessoas com deficiência em três níveis: internacional, regional e nacional, traçando um diálogo entre os níveis de proteção, à luz da teoria do Estado Constitucional Cooperativo, de Peter Häberle. Palavras-chave: Direitos Humanos Fundamentais, Pessoas com deficiência, Processo de dinamogenesis de direitos, Estado Constitucional Cooperativo.   Abstract: This article is about the human fundamental rights of people with disabilities upon the perspective of the “dinamogenesis” process of rights. Because this is a descriptive and exploratory survey, it will be conducted based on biblio- graphical and history research, using both inductive and deductive methods, especially in the critics and ref lections about the normative prescriptions. The terminology “fundamental human rights” is based on the idea of complementarity among national, regional and universal trusteeships, considering that some human rights are constitutionalized and some fundamental rights are internationalized. Hence, we can infer the primacy of fundamental human rights whether in the national or in the international level. In this sense, this article analyzes the legal trusteeship of people with disabilities in three instances, namely, international, regional and national, tracing a dialogue among them, in the light of the theory of Cooperative Constitutional State (Peter Häberle). Key words: Fundamental Human Rights; People with disabilities, Dinamogenesis process of rights, Cooperative Constitutional State. Introdução A explosão na velocidade do processo de globalização econômica ocorrida a partir da segunda metade do século XX gerou mudanças de natureza social, cultural e política na sociedade, que passou a exigir a tutela de novos valores pelo ordenamento jurídico internacional, o que acabou resultando em modificações significativas no direito internacional e, particularmente, na proteção internacional dos direitos do homem. A globalização levou o Estado nacional, ciente de não ser autossu- ficiente, a substituir sua tradicional posição de independência absoluta por uma de interdependência. Com essa abertura ao direito internacional, foi estabelecida uma verdadeira via de mão dupla entre este direito e o estatal, na qual se observou a constitucionalização de direitos humanos e a internacionalização de direitos fundamentais. Ocorreu então a superação do modelo de Estado-Nação por aquele chamado por Peter Häberle 1 de “Estado Constitucional Cooperativo”, que deixou de reivindicar o caráter absoluto da soberania para exercê-la de forma compartilhada 2, adequada a esse novo cenário de cooperação internacional. Além disso, como inevitável consequência da intensificação das relações entre esses Estados, os indivíduos desenvolveram uma consciência de pertencimento ao mundo globalizado. Constatou-se então uma expansão da noção de cidadania, não mais restrita à relação do cidadão com seu Estado, mas vendo-o como parte integrante desse novo cenário internacional cosmopolita. Essa cidadania dinâmica e universal, conceituada por Hannah Arendt como “a consciência do indivíduo sobre o direito a ter direitos”3, compreende direitos civis, políticos, sociais, econômicos e difusos, neces- sariamente atrelados aos valores de liberdade, justiça, igualdade e solidariedade. Pode ser observada aqui uma forte e inequívoca aproximação do novo conceito de cidadania com os direitos humanos, que toma por base o valor universalmente válido da dignidade da pessoa humana 4. O processo de formação dos direitos humanos, pela positivação dos valores axiológicos exigidos pela sociedade em determinado momento, passa a corresponder a um automático alargamento da cidadania dos indivíduos. O surgimento e a valorização do Estado Constitucional Cooperativo e do princípio da soberania compartilhada, aliados ao novo e cada vez mais amplo conceito de cidadania, deram nova cara à cooperação internacional no âmbito dos direitos humanos. Os processos de constitucionalização dos direitos humanos e de internacionalização dos direitos fundamentais tor- naram obrigatória a primazia dos direitos humanos fundamentais, tanto no âmbito nacional quanto no internacional. A proteção desses direitos humanos fundamentais passou a ser realizada por uma relação de comple- mentariedade entre as tutelas nacional, regional e universal desses direitos. As organizações internacionais são a expressão mais visível do esforço de cooperação internacional, e sua participação é fundamental nessa repartição da proteção dos direitos humanos fundamentais em diferentes sistemas. Assim, enquanto o Estado Constitucional Cooperativo realiza a proteção em âmbito nacional dos direitos fundamentais, as organizações regionais e a Organização das Nações Unidas representam a internacio- nalização das instituições de proteção aos direitos humanos, incumbidas de realiza-la nos âmbitos regional e universal, respectivamente. Frise-se que elas foram reconhecidas como sujeitos de direito internacional público materialmente na Declaração dos Direitos Universais do Homem de 1948 e formalmente na Convenção de Viena sobre o direito dos tratados de 1986 (“Viena II”). Podendo criar e garantir direitos no ordenamento jurídico internacional, zelam por um maior equilíbrio na estrutura mundial de poder. Os direitos das pessoas com deficiência, direitos humanos fundamentais de terceira geração, obviamente participam dessa lógica de com- plementaridade entre os sistemas de proteção. Esse artigo visa identificar a formação e ampliação dos diferentes sistemas existentes de proteção dos direitos humanos das pessoas com deficiência, tendo como plano de fundo a evolução tanto dos direitos humanos no âmbito do ordenamento jurídico internacional quanto dos direitos fundamentais no âmbito do ordenamento interno brasileiro. Antes, contudo, cabe explicar o processo pelo qual esses direitos surgiram e indicar os valores que orientaram sua criação. Por se tratar de um estudo

Núcleo de Prática Jurídica: necessidade, implementação e diferencial qualitativo
Artigos Acadêmicos, Direito Educacional

Núcleo de Prática Jurídica: necessidade, implementação e diferencial qualitativo

Núcleo de Prática Jurídica: necessidade, implementação e diferencial qualitativo   Clique aqui para acessar   Revista Jurídica Cesumar. Center of Legal Practice:necessity, implementation and qualitative diferential Vladmir Silveira Samyra Naspolini Sanches   Resumo A presente pesquisa tem por objeto o Núcleo de Prática Jurídica (NPJ) e visa responder sobre a necessidade dele na formação do bacharel em Direito, como pode se dar sua implementação e quais os diferenciais qualitativos de sua execução. Trata-se de um estudo descritivo e exploratório, realizado com base na pesquisa bibliográfica e histórica, servindo-se do método indutivo. Palavras-chave: Ensino jurídico. Educação jurídica. Núcleo de Prática Jurídica. Diretrizes curriculares. Curso de Direito. Abstract The present research has as its object the Center of Legal Practice (NPJ) and aims to answer the need of it in the formation of Bachelor of Law, how may occur your implementation and what are the execution differential qualitatives. Because this was a descriptive, exploratory study will be conducted based on bibliographical and history research, using the inductive method. Keywords: Legal teaching. Legal Education. Center for legal practice. Curriculum guidelines. Law school. Introdução O ensino jurídico no Brasil, recentemente denominado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de educação jurídica, apresenta sérios problemas desde seus primórdios, e as críticas que recebe vão desde a metodologia ao próprio conhecimento disseminado em sala de aula. É certo que tal problemática se insere no quadro geral da educação superior em nosso país, mas não é esse assunto o escopo do presente trabalho, merecendo estudo específico para uma abordagem adequada. Segundo Rodrigues (2000, p. 16), “a realidade do ensino jurídico no Brasil é que ele não forma, deforma” (grifo do autor). Apesar de o Direito encontrar-se entre os cursos mais procurados no vestibular e de formar todos os anos um número de bacharéis superior ao que o mercado de trabalho pode absorver, existe uma reclamação generalizada por bons profissionais. Isso se explica em grande parte pela má qualidade do ensino jurídico. “É necessário reformulá-lo. Essa é uma constatação geral”. (RODRIGUES, 2000, p. 16). Em estudo específico sobre o assunto, Unger (2001, pp. 1-29) conclui enfaticamente: O problema do ensino de Direito no Brasil é um caso extremo. Como está não presta. Não presta, nem para ensinar os estudantes a exercer o Direito, em qualquer de suas vertentes profissionais, nem para formar pessoas que possam melhorar o nível da discussão dos nossos problemas, das nossas instituições e das políticas públicas. Representa um desperdício, maciço e duradouro, de muitos dos nossos melhores talentos. E frustra os que, como alunos ou professores, participam nele: quanto mais sérios, mais frustrados. No contexto da educação jurídica, a presente pesquisa terá por objeto o Núcleo de Prática Jurídica (NPJ), objetivando responder sobre a necessidade de sua existência na formação do bacharel em Direito, sobre como ocorre sua implementação e quais os diferenciais qualitativos de sua execução. Por tratar-se de estudo descritivo e exploratório, será realizado com base na pesquisa bibliográfica e histórica, utilizando-se do método indutivo.   1 Considerações históricas sobre o ensino jurídico no Brasil Segundo Pôrto (2000), o início da grande reforma do ensino jurídico no Brasil foi desencadeado pela Comissão de Ciência e Ensino Jurídico, criada em agosto de 1991 pelo Conselho Federal da OAB, por iniciativa de seu presidente à época, Marcello Lavenère Machado. Encarregada de diagnosticar a situação do ensino jurídico e apresentar propostas de solução, a Comissão era composta pelos professores Paulo Luiz Neto Lôbo (coordenador), Roberto Armando Ramos de Aguiar (relator), Álvaro Villaça Azevedo, Edmundo Lima de Arruda Júnior, José Geraldo de Sousa Júnior e Sérgio Ferraz. A Comissão decidiu iniciar seus trabalhos a partir do “diálogo criativo com os autores, pensadores, professores e pesquisadores que nos últimos anos vêm refletindo e formulando propostas significativas acerca dos problemas do ensino jurídico” (OAB, 1992, p. 7), sendo a consulta realizada em forma de questionário dirigido àqueles que desenvolveram vasta produção acadêmica preocupada com as questões atinentes ao ensino jurídico. Todos os caminhos apontavam para o diagnóstico de uma “crise” (RODRIGUES, 1993). As respostas constituíram um completo raio-X da situação e foram publicadas em 1992, na primeira de uma série de obras da Comissão sobre o tema, com o título de OAB Ensino Jurídico: diagnósticos, perspectivas e propostas. O mapeamento revelou que se tratava de uma “crise” maior do que a imaginada. Em primeiro lugar, percebeu-se que, tradicionalmente, no Brasil, o currículo mínimo termina por converter-se no máximo e é, em geral, composto de matérias codificadas – ou seja, dogmáticas. O ensino do Direito com base em manuais que reproduzem o paradigma dogmático da ciência jurídica se transforma em uma educação conservadora e tradicional, a qual, a partir do estudo abstrato das normas jurídicas, desconhece as reais necessidades sociais, restringindo-se à análise da validade de tais normas e olvidando por completo as questões de sua eficácia e legitimidade. Observou-se que era mantida, outrossim, a tradição dos cursos jurídicos pátrios, de total alienação e despolitização (FARIA, 1987), em que, para estudar a lei, são deixadas de lado questões de suma importância para o país, tais como: corrupção, impunidade, direitos humanos e meio ambiente, para citar alguns exemplos. A formação para a cidadania, que o estudo do Direito necessariamente deveria abordar, bem como o combate às formas de opressão e exclusão na sociedade brasileira exigem “uma cultura jurídica capaz de ir ao encontro da realidade social, de imaginá-la e construí-la como direito” (UNGER, 2001, pp. 1-29). Mas isso, como se pôde constatar, não era estimulado de nenhuma maneira nas faculdades. No que diz respeito às questões didático-pedagógicas, o ensino jurídico realizava-se basicamente com a mesma metodologia da época de sua criação – a aula-conferência. Também conhecida como “aula coimbrã”, numa alusão ao método praticado na Universidade de Coimbra, em Portugal, a aula-conferência caracteriza-se por ser expositiva e ministrada a um elevado número de alunos em uma mesma sala de aula. O conteúdo da aula normalmente se resumia a comentários de Códigos por meio do método dedutivo (RODRIGUES, 1993). As faculdades de Direito foram consideradas “como redutos de uma transmissão arcaica do

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As Possibilidades da Compensação de Precatórios para pagamento de tributos: uma análise com fundamento na dignidade humana

As Possibilidades da Compensação de Precatórios para pagamento de tributos:  uma análise com fundamento na dignidade humana Clique aqui para acessar   Revista Jurídica Cesumar – Mestrado, v. 14, n. 2, p. 557-574, jul./dez. 2014 – ISSN 1677-6402 Vladmir Oliveira da Silveira* Pedro Paulo Corino da Fonseca**   SUMÁRIO: Introdução; 1.1 O Regime de Precatórios na Constituição Federal e seus efeitos; 2 A morosidade no Adimplemento de Precatórios e as Justificativas da Fazenda Pública para não Compensar com Créditos Tributários; 3 A Possibilidade da Compensação de Precatórios para Pagamento de Tributos: uma Análise com Fundamento na Dignidade da Pessoa Humana; 4 Considerações Finais; Referências. RESUMO: O presente texto trata da compensação de precatórios para pagamento de tributos, e tem o objetivo, a partir de uma reflexão sobre a dignidade da pessoa humana, analisar as condições possíveis dessa compensação. Para isso, por meio do método hipotético-dedutivo de revisão bibliográfica e jurisprudencial, o trabalho aborda, inicialmente, os efeitos do Regime de Precatórios na Constituição Federal e suas emendas números 30 e 62. Em um segundo momento, baseado na morosidade do adimplemento dos precatórios, elenca as justificativas da Fazenda Pública para não compensar os precatórios para pagamentos tributários. Por fim, analisa, sob o viés da dignidade da pessoa humana, as possibilidades de compensação de precatórios para pagamento de tributos. Essa formatação vem ao encontro da discussão sobre as mudanças de prioridades políticas e destinações orçamentárias que visam efetivar direitos fundamentais individuais, coletivos e sociais, questionando-se assim sobre a viabilidade do equilíbrio entre o crescimento econômico e o desenvolvimento humano no Brasil. PALAVRAS-CHAVE: Compensação de Tributos; Desenvolvimento Humano; Dignidade da Pessoa Humana; Precatórios. THE POSSIBILIT Y OF COMPENSATING GOVERNMENT PAYMENT BONDS TO PAY TAXES: AN ANALYSIS FOREGROUNDED ON HUMAN DIGNIT Y ABSTRACT: The compensation of government payment bonds for tax payments is discussed, foregrounded on the dignity of the human person. The conditions for such compensation are analyzed. The effects of the Government Payment Bonds in the Brazilian Federal Constitution and its Amendments 30 and 62 are investigated by a bibliographical and jurisprudential review. In the wake of delay in the payment, current essay lists the justifications of the Inland Revenue not to compensate government payment bonds through the payment of taxes. The essay analyzes the possibilities of compensation from the point of view of the dignity of the human person. These arguments are based on the discussion of changes in public priorities and budget aims that materialize in individual, collective and social human rights, while questioning the feasibility of equilibrium between economic growth and human development in Brazil. KEY WORDS: Compensation of Taxes; Human Development; Dignity of the Human Person; Government payment bonds. LAS POSIBILIDADES DE COMPENSACIÓN DE ROGATORIOS PARA EL PAGO DE TRIBUTOS: UN ANÁLISIS FUNDAMENTADO EN LA DIGNIDAD HUMANA RESUMEN: El presente texto trata de la compensación de rogatorios para el pago de tributos y busca, a partir de una reflexión sobre la dignidad de la persona humana, analizar las condiciones posibles de esa compensación. Para ello, por medio del método hipotético-deductivo de la revisión bibliográfica y jurisprudencial, el trabajo aborda, inicialmente, los efectos del Régimen de Rogatorios en la Constitución Federal y sus emendas n. 30 y 62. Enseguida, basado en la morosidad dela adimplemento de los rogatorios, presenta las justificativas de la Fazenda Pública para no compensar los rogatorios para pagos tributarios. Por fin, analiza, desde la perspectiva de la dignidad humana, las posibilidades de compensación de rogatorios para pago de tributos. Esa propuesta acrece la discusión sobre los cambios de prioridades políticas y destinaciones presupuestarias que buscan concretar los derechos fundamentales individuales, colectivos y sociales, cuestionándose así sobre la viabilidad del equilibrio entre el crecimiento económico y el desarrollo humano en Brasil. PALABRAS-CLAVE: Compensación de Tributos; Desarrollo Humano; Dignidad de la Persona Humana; Rogatorios. INTRODUÇÃO A batalha entre os poderes Judiciário, Executivo e Legislativo tem se destacado no que diz respeito ao pagamento de precatórios. Historicamente os precatórios foram acolhidos na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 no Ato das Disposições Transitórias em seu Artigo 33 e na parte permanente no Artigo 200. Os seus requisitos, regimes e demais regras foram estabelecidos no Artigo 100 e emendas nº 30 e 62. Este Instituto Jurídico foi criado para organizar os débitos do orçamento público, ou seja, quando se tem uma decisão judicial que transitou em julgado contra a Fazenda Pública, a ordem de pagamento é feita por meio de precatório. Desse modo, o Poder Público sofrerá uma execução com obrigação de pagar, registrar e dar vista no orçamento e consoante com as disposições e os requisitos estabelecidos no Artigo 100 da Constituição Federal de 1988. A Fazenda Pública, por sua vez, estará obrigada a incluir no orçamento do ano seguinte valor suficiente para arcar com suas dívidas – ou seja, deverá incluir neste cálculo a totalidade dos requisitórios de precatórios daquele período anterior. Ocorre que há um entrave ao pagamento dos precatórios no qual o poder executivo justifica a morosidade do pagamento de suas dívidas para com seus credores. Uma das justificativas é a impossibilidade de pagamento por Estados e Municípios e a inexistência de soluções na medida da possibilidade circunstancial dos devedores. Por isso a problemática dos precatórios surgiu em torno da inadimplência do Poder Público. A ocorrência é antiga, mas alcançou patamares absurdos nos últimos anos, principalmente após a Emenda Constitucional nº 30 de 2000. Este drama é enfrentado por milhares de credores brasileiros, mormente no caso dos precatórios alimentares, de diversas esferas do Poder Público – e, por ironia, dos entes mais ricos da federação, como o governo do Estado de São Paulo e os municípios de São Paulo. Para tanto esse trabalho procura analisar formas do Estado saldar, pelo menos em parte de suas dívidas com seus credores, investigando assim, as justificativas da Fazenda Pública para a morosidade no pagamento dos precatórios, bem como uma das possíveis formas de adimplemento: a compensação de precatório para pagamento de tributos com fundamento na dignidade da pessoa humana e no equilíbrio do crescimento econômico e desenvolvimento humano. 1.1

Processo Judicial Eletrônico e Segurança de dados: a Proteção Digital como novo Direito Humano
Artigos Acadêmicos, Direitos Humanos

Processo Judicial Eletrônico e Segurança de dados: a Proteção Digital como novo Direito Humano

Processo Judicial Eletrônico e Segurança de dados: a Proteção Digital como novo Direito Humano ELECTRONIC JUDICIAL PROCESS AND DATA SECURITY: DIGITAL PROTECTION AS A NEW HUMAN HIGHT Revista Mestrado em Direito Autores: Patricia Martinez Almeida profa.civil@gmail.com Vladmir Oliveira da Silveira vladmir@aus.com.br     Recebido em: 16/08/2013 Aprovado em: 10/09/2013 SUMARIO: Introdução 1. Evolução da Sociedade da Informação 2. Segurança Digital como (novo) Direito Humano 3. A Dicotomia entre Direito de Informação e a Proteção de Dados Pessoais: Implantação do Processo Judicial Eletrônico e a Segurança Digital. Conclusão. Referências   RESUMO O presente estudo sobre processo judicial eletrônico e a segurança de dados tem por finalidade analisar a segurança digital como novo direito humano, delimitando a pesquisa no aspecto da segurança processual e jurídica, dos cidadãos da aldeia digital, no processo judicial eletrônico. Para tanto serão utilizados os métodos hipotético-dedutivo, monográfico, tipológico e histórico, com base em pesquisa teórica bibliográfica e da legislação. Como hipótese inicial adotará como premissa que a proteção de dados no ciberespaço e o exercício da cidadania virtual é projeção da digna condição do homem e conclui que o deslocamento da sociedade real para a virtual não autoriza o abandono estatal da proteção integral aos cidadãos e, tampouco, a invasão aos direitos e garantias à segurança digital e aos Direitos Humanos já consagrados em nosso ordenamento e tutelados na ordem interna e internacional, visando a proteção integral do ser humano. PALAVRAS CHAVE Direitos Humanos; segurança digital; acesso à justiça; processo judicial eletrônico.   ABSTRACT The present study on electronic judicial proceedings and data security aims to analyze the digital security as a new human right, delimiting the research in an legal and procedural aspect of the security of the citizens of the digital village, in the judicial process electronic. For both methods are used hypothetical-deductive,   monographic,   typological and historical based on theoretical research literature and legislation. As initial hypothesis adopt the assumption that the protection of data in cyberspace and virtual citizenship projection is worthy of man’s condition and concluded that the displacement of the Royal Society for the virtual does not authorize the state to abandonment of full protection to citizens , and even in the invasion of the rights and guarantees to digital security and Human Rights already enshrined and protected in our internal and international law aiming the protection of the human being. KEYWORDS Human Rights; digital security, access to justice, judicial process electronic. INTRODUÇÃO O surgimento de novas tecnologias e o compartilhamento de informação pelo ciberespaço acarretou mudanças significativas na sociedade e no comportamento social. A partir da expansão das ferramentas da internet, com maiores possibilidades e realidades na rede mundial de computadores, surge a necessidade da tutela das relações jurídicas havidas na chamada sociedade da informação ou ciberespaço. O presente estudo busca analisar a evolução da sociedade da informação e os novos aspectos do direito no ciberespaço. Notadamente, o direito aparece da necessidade da sociedade. Nesse sentido, os anseios da geração conhecida como Y, os novos comportamentos sociais e comerciais na dita sociedade da informação, que emanaram com a evolução da rede mundial de computadores necessitou e continua necessitando de disciplina e proteção. Nesta perspectiva, o Direito, além de disciplinar e tutelar essa nova realidade, precisou se adequar a tendência tecnologia em prol da efetiva e eficiente prestação da jurisdição por intermédio da informatização do processo judicial. Neste contexto, com a evolução do princípio do acesso à justiça e a necessidade de dar efetividade ao princípio constitucional da duração razoável do processo, com fulcro no art. 5º, LVIII da CF e salvaguardar a celeridade processual, com o advento da Lei 11.419/2006 inaugurou-se uma nova fase processual, qual seja, a do processo judicial telemático. No primeiro item será estudada a evolução da sociedade da informação e a necessidade de tutela dos direitos e deveres havidos no novo espaço: o ciberespaço, criado com a utilização da internet como meio de comunicação interplanetário. O surgimento da chamada cibercultura e seus princípios e a implementação da cibercidadania, também serão observados. No segundo item será analisada a disciplina da segurança digital na proteção dos dados pessoais e comerciais veiculados no ciberespaço e a problemática da ausência de força normativa especifica e regramento à nova realidade do espaço virtual, consubstanciando em desterritorialização estatal. No terceiro item será verificada a dicotomia entre o direito à informação e a proteção digital na implantação do processo judicial eletrônico, esta como inovação necessária na busca da efetivação do princípio da duração razoável do processo, enquanto garantia do acesso à justiça. Com a finalidade de analisar em que medida a instrumentalização digital do processo judicial efetivamente contribui para o acesso à justiça e para a segurança digital aos jurisdicionados, este trabalho pautar-se-á pelo método de abordagem hipotético-dedutivo, e métodos de procedimento monográfico, tipológico e histórico, uma vez que será estudada a evolução da sociedade virtual, enquanto fenômeno social complexo, para tanto se valerá de pesquisa teórica bibliográfica e da legislação interna e alienígena na consecução da presente pesquisa. Como hipótese inicial será adotada como premissa que a proteção de dados no ciberespaço e o exercício da cidadania virtual se consubstanciam em projeção da digna condição do homem e que o deslocamento da sociedade real para a virtual não autoriza o abandono da proteção integral aos cidadãos e, tampouco, a invasão aos direitos e garantias à segurança digital e os Direitos Humanos já consagrados em nosso ordenamento e tutelados na ordem interna e internacional, visando o desenvolvimento integral do ser humano. Evolução da sociedade da informação Segundo Albert Einstein, em entrevista nos anos 50, três grandes bombas explodiram durante o século XX: (1) a demográfica, (2) a atômica e (3) das telecomunicações. Nos dizeres de Pierre Lévy (1999, p.13), esta última assim considerada por gerar grande movimentação de informação, com aumento vertiginoso da disponibilidade de dados de fácil acesso. Precedida pela comunicação exclusivamente oral e posterior surgimento da escrita estática, e, proporcionada pelo desenvolvimento das tecnologias digitais de informação e comunicação, a comunicação interativa, virtual, traz em seu bojo facilidades na transmissão e

Internalização das Convenções da OIT no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Artigos Acadêmicos, Direito Internacional, Direitos Humanos

Internalização das Convenções da OIT no Ordenamento Jurídico Brasileiro

Internalização das Convenções da OIT no Ordenamento Jurídico Brasileiro Clique aqui para acessar Autores: Fernanda de Miranda S. C. Abre Vladmir Silveira RESUMO: O presente trabalho objetiva analisar a evolução do processo de internalização das Convenções da Organização Internacional do Trabalho no ordenamento jurídico pátrio, estudando, para tanto, o arcabouço normativo dessa importante organização e as possíveis consequências da adoção de suas Convenções com status de Emenda Constitucional. Trata-se de estudo descritivo e exploratório, realizado com base em pesquisa bibliográfica e histórica, utilizando-se por vezes do método dedutivo e em outras, do indutivo, principalmente nas críticas e reflexões acerca dos textos normativos. Palavras-chave: OIT; Convenções; Direito Internacional dos Direitos Humanos. INTRODUÇÃO O fenômeno denominado globalização econômica vem sendo largamente discutido e analisado em suas causas e consequências, bem como no impacto que provoca no conceito clássico do Estado- nação, com o esmaecimento das fronteiras que lhe são inerentes. Sendo a globalização econômica caracterizada pela livre circulação dos bens de produção, entre os quais a mão de obra, inegavelmente gerará efeitos que reverberam nos contratos de trabalho mundo afora. Esses efeitos serão estudados no presente trabalho. Com o intuito de mitigar as consequências deletérias da globalização no tocante aos trabalhadores, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) tem desenvolvido alguns instrumentos visando a fixar um patamar civilizatório mínimo, a ser observado por todos os seus membros. A proposta deste artigo é delinear a evolução do pensamento jurídico sobre a aplicabilidade e o alcance de tais instrumentos no Brasil, a partir de análise da jurisprudência nacional. Partindo-se da premissa de que as Convenções Internacionais do Trabalho são tratados de direitos humanos, analisaremos num primeiro momento os diferentes tratamentos recebidos por esses ins- trumentos internacionais antes e depois da Constituição Federal de 1988 (CF/88), e, por fim, com o advento da Emenda Constitucional nº 45/2004. Depois, abordaremos a OIT como sujeito de direito interna- cional público, bem como as normas por ela produzidas. Na sequência, será esmiuçado o entendimento segundo o qual as Convenções Internacionais do Trabalho e outros tratados de di- reitos humanos, uma vez ratificados, teriam aplicabilidade imediata, independentemente do iter do artigo 5º, § 3º, da CF/88, com a am- pliação do arcabouço dos direitos trabalhistas, essenciais à efetiva garantia da dignidade da pessoa humana do trabalhador. Por fim, examinaremos o princípio da norma mais favorável na instrumenta- lização das referidas Convenções e os entendimentos adotados a res- peito, sintetizados nas teorias da acumulação e do conglobamento. TRATADOS DE DIREITOS HUMANOS NO DIREITO BRASILEIRO Conforme ensina Francisco Rezek, “tratado é todo acordo formal concluído entre pessoas jurídicas de direito internacional público e destinado a produzir efeitos jurídicos”.3 O mesmo se depreende do artigo 2º da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 1986, segundo o qual tratado é um acordo internacional celebrado por escrito entre um ou vários Estados e entre uma ou várias Organizações Internacionais, ou entre várias Organizações Internacionais, regido pelo direito internacional, constando de  um instrumento único ou de dois ou mais instrumentos conexos, qualquer que seja a sua denominação. Tratados   são   os   meios   mais   adequados   de   estabelecer obrigações e outras disposições a ser observadas pelos Estados em suas relações internacionais e, quando for o caso, também na esfera nacional. É importante notar que não há limitação para as matérias abordadas e disciplinadas pelos diferentes tratados. No entanto, é possível identificar crescente processo de internacionalização de certos temas, objetos de convenções internacionais que buscam incrementar sua observância, fixando patamares mínimos a ser respeitados por todos. Entre essas matérias podemos destacar os Direitos Humanos, cuja preeminência é aceita de forma universal. Diz-se que os valores ínsitos aos Direitos Humanos são tendencialmente universais – ainda que não integralmente aplicados e respeitados por todos os Estados – porque integram o conjunto do jus cogens internacional. Explica Cláudio Finkelstein que jus cogens foi a denominação dada à norma peremptória, obrigatória, inderrogável, seja pela vontade dos Estados, seja por imposição de Estado. Em termos concretos tem um significado além da cogência comum a qualquer ordem jurídica. (…) O conceito é baseado em uma aceitação de valores fundamentais e superiores, por toda a comunidade internacional, dentro do sistema e, em alguns aspectos, assemelham- se ao conceito de ordem pública internacional ou a ordem pública na ordem jurídica interna. (…) É um corpo de princípios imperativos de direito internacional que são universais e não derrogáveis. Com efeito, o ‘jus cogens’ representa as normas fundamentais do direito internacional que se aplicam a todos os Estados, independentemente de vontade ou consentimento.4 Em que pese tamanha aquiescência acerca de sua relevância, o mesmo não ocorre com relação à sua definição. Dada a subjetividade inerente à matéria, não há um conceito de Direitos Humanos amplamente aceito e observado, assim, para que se possa analisar adequadamente os Direitos Humanos é fundamental referir, mesmo que brevemente, suas diferentes gerações ou dimensões5   – e, ainda que pensadores defendam a existência de uma quarta e até de uma quinta geração de Direitos Humanos, optamos pela divisão clássica em três gerações ou dimensões. São elas: a) Direitos Humanos de primeira geração: decorrentes de um longo processo histórico, cujo marco inicial foi a Magna Carta assinada na Inglaterra pelo rei João Sem-Terra (1215), tais direitos culminaram na Revolução Francesa (1789), revelando-se nos direitos atinentes às liberdades públicas e aos direitos políticos, traduzindo o valor de liberdade; b) Direitos Humanos de segunda geração: como consequência da Revolução Industrial europeia, no século XIX, surgiram os direitos sociais, culturais e econômicos, correspondendo aos direitos de igualdade; c) Direitos Humanos de terceira geração: com a crescente globalização, emergiu a necessidade de complexas tutelas difusas, especialmente na esfera ambiental e na dos direitos do consumidor, assim, o ser humano, inserido numa coletividade, passou a ter os chamados “direitos de solidariedade”. No que tange à doutrina jusnaturalista, não se pode negar a importância de sua formalização escrita para a nova perspectiva da tutela dos Direitos Humanos. Num primeiro momento, isso ocorreu apenas na esfera internacional com as declarações de Direitos Humanos, que são atos solenes através dos quais organizações intergovernamentais regionais ou mundiais e as

Como devastação e aquecimento podem fazer Brasil deixar de ser potência agrícola global.
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Empresas e Direitos Humanos

Empresas e Direitos Humanos BUSINESS AND HUMAN RIGHTS.   Clique aqui para acessar   Vladmir Oliveira da Silveira Pós-Doutor em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC.  E-mail: vladmir@aus.com.br Patricia Martinez Almeida Mestra em Direito pela Universidade Nove de Julho – UNINOVE. E-mail: profa.civil@gmail.com Editora Científica: Prof. Dra. Mariana Ribeiro Santiago DOI – 10.5585/rtj.v4i2.252 REVISTA THESIS JURIS   RESUMO O presente estudo sobre empresas e direitos humanos tem por objetivo analisar a mutação do papel da empresa na sociedade de consumo e as responsabilidades advindas desse novo plexo de relações globalmente intermediadas pelas empresas transnacionais. Para tanto, será utilizado o método de abordagem hipotético dedutivo, com base em pesquisa bibliográfica e documental. Como hipótese inicial será adotada a premissa que tais modificações justificam o dever de observância aos direitos humanos pelas empresas, tal como proposto pela Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, e, como consequência, com a internalização dos custos necessários à prevenção e proteção de tais direitos, em razão do novo adensamento da dignidade humana e do processo de funcionalização do direito. PALAVRAS CHAVE: Direito Internacional dos Direitos Humanos; funcionalização do Direito; empresas e direitos humanos. ABSTRACT The present study on business and human rights aims analyze the mutation of the company’s role in the consumer society and the resulting responsibilities of these relations globally mediated by transnational businesses. For this purpose, will be used the method of hypothetical deductive approach , based on documentary and bibliographical research. As an initial hypothesis will be adopted the premise that such changes justifies the duty to respect human rights by businesses, as proposed by the United Nations Human Rights Council, and, consequently, with the internalisation of necessary costs relating to the prevention and protection of such rights, due to the new densification of human dignity and the process of the functionalization of law. KEYWORDS: International Human Rights Law; functionalization of law; businesses and human rights. INTRODUÇÃO A expansão da industrialização resultou na alteração na moldura do consumo, pois com a produção em larga escala foi preciso criar uma cultura voltada a disseminação dos produtos e, assim, atender as novas expectativas do industrialismo capitalista que se estendia pelo mundo – ocidental, ao menos. E, logo, o consumo ganha contornos distintos, passando do consumo de subsistência ao de acúmulo e de constante renovação. No pós-Segunda Guerra Mundial, as empresas começam um movimento de deslocamento de suas atividades a diversos países, e, com o término da guerra fria, têm maior alcance para circulação de seus produtos com a queda da última barreira ao capitalismo global – o muro de Berlim – e o modelo socialista de economia do leste europeu. Neste sentido, as empresas passam a deslocar não somente suas atividades aos demais países, mas também a sua forma de gerir tais atividades, por intermédio de negociações com os países de acolhida. Na qual se pactuam o dever de ingerência do Estado receptor na administração empresarial, assim como, a percepção de benefícios pela instalação de filiais no território estatal (relativização de direitos trabalhistas, tributação mais favorável com benefícios fiscais) e, em contrapartida, ofertando manutenção de postos de trabalho e circulação de riqueza. Dito de outra maneira há uma transnacionalização das empresas que negociam seus pactos globais com Estados em desenvolvimento e até mesmo com os sem desenvolvimento, relativizando direitos humanos e deveres nacionais em troca de uma promessa de desenvolvimento econômico. O que, com efeito, foi potencializado com a expansão das novas tecnologias da informação e comunicação para o comércio global. Desta forma, o presente estudo sobre empresas, direitos humanos     e novas tecnologias (NTs) tem por finalidade analisar a mutação do papel da empresa na nova sociedade e as responsabilidades advindas desse novo plexo de relações globalmente intermediadas pelas novas tecnologias. Notadamente, pela prevalência dos Direitos Humanos, a proteção dos direitos sociais e dos difusos – proteção trabalhista, aos consumidores, meio ambiente – e a função social da empresa, ou seja, a sua relevância na manutenção dos postos de trabalho, arrecadação fiscal e circulação de riquezas. Com esse objetivo, serão estudados no item 1 os princípios orientadores sobre a empresa e os direitos humanos relatados em 2011 por John Ruggie, como resultado de sua pesquisa para o Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) no contexto do crescimento da empresa no século XX, com a deslocalização de suas atividades e na relativização do poder estatal na desterritorialização do controle dos Estados sobre as atividades transnacionais. No item 2 será avaliada a necessidade de implementação de tais princípios para a proteção ao ser humano na sociedade mundial e as novas responsabilidades das empresas (Mercado) e dos Estados para a promoção e proteção dos direitos humanos e os instrumentos para o ressarcimento das violações à dignidade humana. Como hipótese inicial será adotada a premissa de que as alterações no paradigma da contratação global justificam o dever de observância dos direitos humanos pelas empresas e os parâmetros para proteger, respeitar e reparar, tal como proposto pela Conselho de Direitos Humanos da ONU. E, como consequência, a responsabilidade pela internalização dos custos necessários à prevenção e proteção de tais direitos pelas empresas, em razão do novo adensamento da dignidade humana e o processo de funcionalização do direito. Para tanto, a pesquisa pautar- se-a pelo método de abordagem hipotético dedutivo, com base em pesquisa bibliográfica e documental. PARÂMETROS DA ONU PARA AS EMPRESAS E OS DIREITOS HUMANOS Se o Leviatã foi o símbolo da política moderna, então a posição moral dos ‘poderes nacionais’ e das superpotências será reproduzida no futuro pela imagem de Lemuel Gulliver, que após um inocente cochilo se vê amarrado a um sem-número de finíssimas correntes (BECK, 1999, pp. 133-134). Desde o relatório de desenvolvimento humano global de 2000 do Programa das Nações Unidas para o desenvolvimento (PNUD) é que se destaca a relevância da ação dos atores não estatais para o fomento e proteção no desenvolvimento do ser humano na sociedade globalizada 1. Segundo Beck (1999, p. 17), o novo modelo econômico que se instaura com a ruptura da última contenção ao capitalismo global, no

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